domingo, 12 de setembro de 2010

Além da terra, além do céu – Carlos Drummond de Andrade


Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

SONETO DO OLHAR


Que olhar de monja em longa penitência
O olhar daqueles olhos macerados!
Pairava-lhe talvez na morna essência
Uma alma carregada de pecados.

Para que mundos, para que existência,
Tão além desta vida, ei-los voltados!
Ó inacessível, mística dolência
De uns olhos a sonhar outros noivados...

Voz do passado, som que ressuscita!
Olhar tão cheio de palavras mortas
Daqui por certo que não pode ser...

Alma, para me ver, Alma bendita,
Põe-te de luto nessas duas portas
Com uma tristeza de quem vai morrer...

SONETO DAS MÃOS


Mãos de finada, aquelas mãos de neve,
De tons marfíneos, de ossatura rica,
Pairando no ar, num gesto brando e leve,
Que parece ordenar mas que suplica.

Erguem-se ao longe como se as eleve
Alguém que ante os altares sacrifica:
Mãos que consagram, mãos que partem breve,
Mas cuja sombra nos meus olhos fica...

Mãos de esperança para as almas loucas,
Brumosas mãos que vêm brancas, distantes,
Fechar ao mesmo tempo tantas bocas...

Sinto-as agora, ao luar, descendo juntas,
Grandes, magoadas, pálidas, tateantes,
Cerrando os olhos das visões defuntas...

domingo, 29 de agosto de 2010

ORIGEM DOS ECLIPSES


Vários povos têm mitos e lendas relacionados com os eclipses e os índios brasileiros não são diferentes. Recolhemos alguns mitos sobre os eclipses lunar e solar, contados pelos índios da família tupi-guarani, das regiões norte e sul do Brasil.

Eclipse Lunar:

No início do tempo e do espaço, antes de se fixarem no céu, o Sol e seu irmão mais novo, a Lua, habitavam a Terra, vivendo juntos diversas aventuras. Para os Guarani, tanto o Sol como a Lua são considerados do sexo masculino. Um dia, encontraram Charia, um espírito maléfico, pescando em um rio.

Com o objetivo de importunar Charia, que não tinha percebido os dois irmãos, o Sol mergulhou e mexeu o anzol, imitando um peixe grande. Charia puxou o anzol vazio, caindo para trás. O Sol repetiu o seu gesto por três vezes e em todas elas Charia caiu de costas. "Agora é a minha vez", disse a Lua sorrindo. Então, ela mergulhou e foi deslizando na direção do anzol. No entanto, Charia foi mais rápido: pescou a Lua e a matou com um bastão de madeira. Depois, ele a levou para casa, como se fosse um pescado, para comer com sua mulher.

Quando estavam cozinhando a Lua, o Sol chegou e foi convidado por Charia para comer o peixe. Ele agradeceu dizendo que aceitaria apenas de um pouco de caldo de milho e pediu que não jogassem fora os ossos do peixe pois gostaria de levá-los consigo. Depois, recolhendo os ossos, o Sol levou-os para longe e, utilizando a sua própria divindade, ressuscitou o seu irmão mais novo.

Assim, um eclipse lunar representa a Lua sendo devorada por Charia, sendo que a cor avermelhada é o próprio sangue da Lua que a oculta. A Lua só ressurge em toda a sua plenitude, como lua-cheia, porque o seu irmão mais velho, o Sol, a ressuscita e salva.


Eclipse Solar:

Quando queria comer peixe, o Sol levava seu filho para lavar os pés no rio. Dessa maneira, os peixes ficavam atordoados e fáceis de pegar.

Certo dia, enquanto o Sol e seu filho pescavam, Charia apareceu e pediu emprestado o menino, dizendo que ele também queria pegar alguns peixes. O Sol, sem nada desconfiar, emprestou seu filho. No entanto, Charia levou-o para a floresta e golpeou-lhe o corpo todo como se golpeia o cipó timbó, dando o exemplo do que se faria com o timbó que ficou sendo utilizado como veneno de pescar.

Devido aos golpes, Charia matou o filho do Sol, que ficou furioso, atacando o espírito maléfico. Os dois lutaram muito, derrubando um ao outro. Quando Charia pensava que havia vencido a batalha, o Sol levantou-se novamente afugentando Charia.

As conseqüências dessa luta são, até hoje, os eclipses solares, onde Charia é representado, em geral, por uma onça que tenta devorar o Sol.

A LIÇÃO DO FEITICEIRO


Um feiticeiro africano conduz seu aprendiz pela floresta. Embora mais velho, caminha com agilidade, enquanto seu aprendiz escorrega e cai a todo instante. O aprendiz blasfema, levanta-se, cospe no chão traiçoeiro, e continua a acompanhar seu mestre.

Depois de longa caminhada, chegam a um lugar sagrado. Sem parar, o feiticeiro dá meia volta e começa a viagem de volta.

- Você não me ensinou nada hoje - diz o aprendiz, levando mais um tombo.

- Ensinei sim, mas você parece que não aprende - respondeu o feiticeiro. - Estou tentando lhe ensinar como se lida com os erros da vida.

- E como lidar com eles?

- Como deveria lidar com seus tombos - responde o feiticeiro. - Em vez de ficar amaldiçoando o lugar onde caiu, devia procurar descobrir o que te fez escorregar.

ORIGEM DO ARCO-ÍRIS


Houve uma vez em que as cores do mundo começaram uma disputa entre si. Cada uma reivindicava para si que era a melhor. A mais importante. A mais útil. A favorita...

A cor Verde disse: - Claro que sou a mais importante. Eu sou sinal de vida e de esperança. Eu fui a escolhida para a grama, árvores e folhas. Sem mim, morreriam todos os animais. Examine o campo e verá que sou maioria.

A cor Laranja, estando próxima, colocou a boca no trombone: - Eu sou a cor da saúde e força. Eu posso estar escassa, mas eu sou preciosa porque eu sirvo às necessidades da vida humana. Eu sou levada nas vitaminas mais importantes. Pense em cenouras, abóboras, laranjas e mamões. Eu não fico vadiando o tempo todo, mas quando eu encho o céu ao amanhecer ou ao pôr-do-sol, minha beleza é tão impressionante que ninguém mais pensa em qualquer uma de vocês.

A cor Azul interrompeu: - Você só pensa na terra, mas deve considerar o céu e o mar. A água é a base da vida e é retirada pelas nuvens do mar profundo. O céu dá espaço e paz e serenidade. Sem minha paz, você não seria nada.

A cor Rosa, já cheia de tudo, falou com grande pompa: - Eu sou a cor da realeza e do poder. Reis, chefes e bispos sempre me escolheram, porque eu sou sinal de autoridade e sabedoria. As pessoas não me questionam! Elas escutam e obedecem.

A cor Azul Marinho, muito mais calma que todas as outras, mas da mesma maneira e com muita determinação, disse: - Pensem em mim. Eu sou a cor do silêncio. Vocês nem sempre me notam, mas sem mim todos vocês ficam superficiais. Eu represento o pensamento e a reflexão, crepúsculo e água profunda. Vocês precisam de mim para o equilíbrio e para o contraste, para a oração e para a paz interior.

A cor Vermelha não aguentou por muito tempo e gritou: - Eu governo todos vocês! Eu sou sangue - o sangue da vida! Eu sou a cor do perigo e da coragem. Eu estou disposta a lutar por uma causa. Eu trago fogo, o sangue. Sem mim, a terra estaria tão vazia quanto a lua. Eu sou a cor da paixão e do amor.

Finalmente, a cor Amarela riu: - Você é sempre tão séria! Eu trago risada, alegria e calor para o mundo. O sol é amarelo, a lua é amarela, as estrelas são amarelas. Toda vez que se olha para um girassol, o mundo inteiro começa a sorrir. Sem mim, não haveria nada divertido.

E assim, as cores se ostentavam, cada uma se convencendo de sua superioridade. A disputa estava cada vez mais acirrada, quando, de repente, um flash surpreendente de um trovão iluminou tudo... A chuva verteu implacavelmente. As cores se encolheram de medo, enquanto procuravam ficar mais perto uma das outras.

No meio do barulho, a chuva começou a falar: - Vocês, cores tolas, lutando entre si, cada uma tentando dominar as outras... vocês não sabem que cada cor traz um propósito especial? Nem igual, nem diferente? Dêem as mãos e venham a mim.

Fazendo como lhes fora dito, as cores se uniram e deram-se as mãos.

A chuva continuou: - De agora em diante, quando chover, cada uma de vocês se estirará pelo céu, em um grande arco colorido, para lembrar que se pode viver em paz. Criarão o Arco-Íris; e ele será sempre um sinal de esperança.


E assim, sempre que uma boa chuva lava o mundo, um Arco-Íris aparece no céu, mostrando a amizade e a paz entre as cores que dura até hoje e durará para sempre.

A RAPOSA E O LENHADOR


"Existiu um Lenhador viúvo que acordava às seis da manhã e trabalhava o dia inteiro cortando lenha, e só parava tarde da noite.

Ele tinha um filho lindo, de poucos meses e uma raposa, sua amiga, tratada como bicho de estimação e de sua total confiança.

Todos os dias o lenhador ia trabalhar e deixava a raposa cuidando de seu filho. Todas as noites ao retornar do trabalho, a raposa ficava feliz com sua chegada.

Os vizinhos do Lenhador alertavam que a Raposa era um bicho, um animal selvagem, e portando, não era confiável. Quando ela sentisse fome comeria a criança.

O Lenhador, sempre retrucando com os vizinhos, falava que isso era uma grande bobagem. A raposa era sua amiga e jamais faria isso.

Os vizinhos insistiam: "Lenhador, abra os olhos ! A Raposa vai comer seu filho." - "Quando sentir fome, comerá seu filho !

Um dia o Lenhador, muito exausto do trabalho e muito cansado desses comentários, ao chegar em casa, viu a Raposa sorrindo como sempre e sua boca totalmente ensangüentada... O Lenhador suou frio e, sem pensar duas vezes, acertou o machado na cabeça da raposa... Ao entrar no quarto desesperado, encontrou seu filho no berço dormindo tranqüilamente e ao lado do berço uma cobra morta...

O Lenhador enterrou o Machado e a Raposa juntos.


Se você confia em alguém, não importa o que os outros pensem a respeito, siga sempre o seu caminho e não se deixe influenciar... E, principalmente, não tome decisões precipitadas..."

LENDA DE OSÍRIS


"Há muito tempo... quando ainda não havia o Egito ... apenas bandos de caçadores nômades e selvagens ... existiu um rei-deus chamado Osíris, casado com a propria irmã, a rainha-deusa Ísis. Eles eram deuses bons. Osíris ensinou o povo a viver em paz, a se organizar em cidades. A forjar armas de metais para se defender dos animais selvagens. A cultivar a terra, para dela tirar seu sustento. Ísis, por sua vez, organizou as famílias, livrando-as, através de sua magia, de todos os males e doenças. Era a deusa protetora do lar, das mães e das crianças.

Havia outro deus, chamado Tot, deus da ciência. Ele ensinou o povo a ler e a escrever, pois era o senhor da palavra criadora e mágica. Assim nasceu a civilização egípcia.

Osíris ficou tão feliz com os resultados que resolveu sair pelo mundo, ensinando todos os povos a fazer a mesma coisa, assim como aconteceu no Egito. E partiu, deixando no trono Ísis, sua fiel companheira. Com ele foram dois deuses amigos: Tot e Anúbis, o deus dos mortos. Mas existia no Egito outro deus, chamado Seth, o irmão mais moço de Osíris. Ele não herdara o trono, pois naquele tempo só os primogênitos tinham direito a isso. Cheio de ódio, planejou uma terrível vingança contra o irmão. Quando Osíris voltou, radiante, de sua viagem, Seth ofereceu-lhe um banquete. Então, mandou vir uma grande caixa, ricamente enfeitada, e propôs uma brincadeira: a caixa pertenceria a quem coubesse dentro dela, sem deixar o menor espaço vazio. Todos os deuses convidados tentaram, mas como eram de pequena estatura, sempre sobrava algum espaço. Acontece que Seth havia mandado fazer a caixa do tamanho exato de Osíris, que era alto e forte. Quando Osíris finalmente entrou na caixa, ela serviu perfeitamente. Ato contínuo, Seth a lacrou com chumbo e mandou jogá-la no rio Nilo. Os outros deuses, apavorados, fugiram todos, tomando a forma de animais. Ísis, desesperada, rasgou sua roupa, mas com a ajuda de Tot conseguiu fugir. E, mesmo sabendo que Osíris estava morto, resolveu resgatar seu corpo para sepultá-lo condignamente.

Díficil procura... Por longo tempo, Ísis perambulou pelo Egito. Como não sabiam que se tratava de uma deusa, e estivesse vestida com andrajos, ninguém a queria receber. Seth, por sua vez, sempre vingativo, ordenava que espíritos malignos atrapalhassem seus caminhos... Mas Ísis tinha grande poder, e sua escolta era constituída de sete escorpiões venenosos que a protegiam, como muralha viva, de todos os males. Perguntando aqui e ali, soube por algumas crianças que a caixa, boiando no Nilo, chegara até o mar ... Ísis continuou viagem e, finalmente, chegou à cidade de Biblos. Lá, descobriu que a caixa tinha ancorado junto a uma moita, e esta, por encanto, se transformara numa grande acácia, cujo tronco absorvera a caixa com o corpo de Osíris. A árvore era tão linda e estranha que o próprio rei do lugar mandou que fosse levada como coluna para seu palácio. Ísis resolveu usar sua magia. Então, todas as noites se transformara numa pequena andorinha e ficava rodopiando em torno da coluna, no palácio do rei, enquanto soltava pungentes trinados ... Isso não adiantou muito e ela mudou de tática, voltando à forma de mulher, fez amizade com as criadas da rainha, que iam buscar água no poço. Ficaram tão encantadas e falaram tanto dela que até a rainha quis conhecê-la. Logo, Ísis foi transformada na governante do pequeno príncipe, herdeiro do trono. Mesmo assim, todas as noites, ela ainda se transformava em andorinha e, rodeando a coluna, cantava tristemente para o amado esposo.

Um dia, a rainha entrou inesperadamente no quarto do filho e ficou apavorada: o pequeno berço estava rodeado pelas chamas, enquanto sete escorpiões formavam um círculo agressivo ao seu redor. Os gritos da rainha atraíram o rei e a guarda, mas Ísis, impaciente, apagou o fogo com um simples gesto. Depois contou ao rei e à rainha, assustados, que, em gratidão pela hospitalidade recebida, teria dado a imortalidade ao príncipe, através das chamas purificadoras. Mas, com a entrada da rainha, o encanto se quebrara para sempre. A rainha ficou muito triste, mas o rei se sentiu profundamente honrado de ter dado hospitalidade a uma deusa. E disse a Ísis que pedisse o que quisesse. Na mesma hora, ela pediu a coluna do palácio. Tirou dela a caixa com os restos mortais de Osíris, deixando a árvore como relíquia sagrada para o rei e o povo. Então voltou para sua terra, mas, no caminho, não resistindo á curiosidade, abriu a caixa. Foi tão grande sua dor vendo o que restara de Osíris, que se transformou num falcão e começou a voar em círculos; por milagre, nesse instante, foi fecundada pelo marido morto.

Quando finalmente voltou ao Egito, Ísis, já de volta à sua forma humana, escondeu a caixa nos pântanos, para que ninguém a encontrasse. Mas Seth era um deus maligno. Certa noite, quando caçava nos pântanos, encontrou a caixa com o corpo do irmão. Louco de fúria, esquartejou o corpo em 14 partes que mandou espalhar por todo o Egito.

Não havia terminado o tormento de Ísis. Ela recomeçou sua busca apaixonada, pelo Egito, até que, depois de terríveis fadigas, conseguiu encontrar os 13 pedaços. O outro fora devorado por um esturjão do Nilo. Mas como devolver a vida a Osíris, ressuscitá-lo? Ansiosa, Ísis pediu ajuda a vários deuses, parentes ou amigos: a Néftis, sua irmã e esposa de Seth, mas inocentes de seus crimes, e a Tot e Anúbis. Anúbis embalsamou o corpo, daí surgindo a primeira múmia do Egito. Osíris ressuscitou, mas não pôde mais reinar na Terra, e sim no "lugar que fica além do horizonte ocidental".

Conseguido seu intento, Ísis escondeu-se no pântano, para proteger a vida do seu filho que esperava, contra a vingança de Seth. Quando o menino nasceu, ela lhe deu o nome de Hórus, cujo olho direito era o sol, e o esquerdo era a lua. E se transformava, quando queria, nun grande falcão, que voava livre pelos céus ... Quando Hórus cresceu, tornou-se um valente guerreiro. Reuniu os fiéis súditos de Osíris para vingar o pai ... Travou feroz batalha com Seth, que durou três dias e três noites, da qual Seth saiu gravemente ferido. Quase moribundo e por artes de feitiçaria, Seth setransformou num javali negro que arrancou o olho esquerdo de Hórus ... Nesse instante, a lua parou de brilhar no céu, o que deixou o povo apavorado. A batalha continuava sem fim, até que Ísis, desesperada, pois Seth também era seu irmão, pediu ao filho que desse fim a ela. Hórus, enraivecido, decepou a cabeça da mãe. Nesse instante, Tot, por sua conta, resolveu intervir; deu nova cabeça a Ísis, curou Seth, mas antes exigiu que ele devolvesse o olho esquerdo de Hórus. Depois de duas semanas, a lua voltou a brilhar no céu, para alegria do povo.

Porém, os deuses, descontentes, exigiram que Tot presidisse um julgamento, para decidir quem era o herdeiro de Osíris no trono do Egito. Seth acusava Hórus de ter sido gerado após a morte do pai, ao que Hórus replicava que Seth não merecia confiança, pois sempre agira de má fé. O processo durou oitenta anos. Finalmente, o Divino Tribunal dos deuses decidiu que: o Egito seria dividido em dois: o baixo Egito ficaria com Hórus e o alto Egito com Seth. Isso aconteceu há 13.500 anos antes de Menés ... "

(A lenda foi recolhida por Plutarco - historiador grego que viveu há dois mil anos, no início da era cristã, e reproduzida largamente até agora.)

O ANJO SURDO


Conta-se que uma mulher vivia sozinha e muito se lamentava de solidão e nenhuma companhia. Ninguém jamais aparecia em sua casa.

Certa manhã, chovia muito, e alguém bateu à sua porta: era um pequeno homem, tremendo de frio, molhado da cabeça aos pés. Vendo o visitante tão inesperado, imediatamente mandou que ele entrasse.

Ali, com as vestes pingando, ele ouviu a mulher que por mais de uma hora lamentou sua solidão e falta de companhia. Ela não lhe ofereceu roupas secas ou algo quente para se aquecer, tão envolvida que estava em suas próprias queixas. Ele não tirava os olhos dos seus lábios em movimento ansioso, contínuo e disparado.

Cessada a chuva, ele fez menção de sair da casa, no que a mulher se inquietou:

"Espere! Nem sei seu nome! Você voltará? "

Ao que o homem reagiu, estendendo-lhe um papel totalmente seco, onde se lia:

"Sou o Anjo Surdo. Só posso ouvir corações. Trago o remédio que cura a solidão, fazendo nascer amizades. Seu efeito não se manifesta naqueles que só falam de si e pensam apenas em si próprios."

Isto dito, desapareceu...e nunca mais alguém bateu naquela porta.

DUAS ASAS


Muito tempo atrás...depois do mundo ser criado e da vida completá-lo... Houve num dia, numa tarde de céu azul e calor ameno, um encontro entre Deus e um de seus incontáveis anjos. Acredita?

Deus estava sentado, calado, sob a sombra de um pé de jabuticaba. Lentamente, sem pecado, Deus erguia suas mãos e colhia uma ou outra fruta. Saboreava sua criação negra e adocicada. Fechava os olhos e pensava. Permitia-se um sorriso piedoso. Mantinha seu olhar complacente.

Foi então que das nuvens um de seus muitos arcanjos desceu e veio em sua direção. Já ouviu a voz de um anjo? É como o canto de mil baleias. É como o pranto de todas as crianças do mundo. É como o sussurro da brisa. Ele tinha asas lindas... brancas, imaculadas.

Ajoelhou-se aos pés de Deus e falou:

"Senhor... visitei sua criação como pediu. Fui a todos os cantos. Estive no sul, no norte, no leste e oeste. Vi e fiz parte de todas as coisas. Observei cada uma de suas criações humanas. E por ter visto vim até o senhor... para tentar entender. Por quê? Por que cada uma das pessoas sobre a terra tem apenas uma asa? Nos anjos temos duas... podemos ir até o amor que o senhor representa sempre que desejarmos. Podemos voar para a liberdade sempre que quisermos. Mas os humanos com sua única asa não podem voar. Não podem voar com apenas uma asa..."

Deus, na brandura dos gestos, respondeu pacientemente ao seu anjo:

"Sim... eu sei disso. Sei que fiz os humanos com apenas uma asa..."

Intrigado com a consciência absoluta de seu senhor, o anjo queria entender e perguntou:

"Mas por que o senhor deu aos homens apenas uma asa quando são necessárias duas asas para se poder voar... para se poder ser livre?"

Conhecedor que era de todas as respostas, Deus não teve pressa para falar. Comeu outra jabuticaba, escura e suave. E então respondeu:

"Eles podem voar, sim, meu anjo. Dei aos humanos apenas uma asa para que eles pudessem voar mais e melhor que Eu ou vocês, meus arcanjos... Para voar, meu amigo, você precisa de suas duas asas... Embora livre, sempre estará sozinho. Talvez da mesma maneira que Eu... Mas os humanos... os humanos com sua única asa precisarão sempre dar as mãos para alguém a fim de terem suas duas asas. Cada um deles tem na verdade um par de asas... uma outra asa em algum lugar do mundo que completa o par. Assim eles aprenderão a se respeitar, pois ao quebrar a única asa de outra pessoa podem estar acabando com as suas próprias chances de voar. Assim, meu anjo, eles aprenderão a amar verdadeiramente outra pessoa... Aprenderão que somente se permitindo amar eles poderão voar. Tocando a mão de outra pessoa em um abraço correto e afetuoso eles poderão encontrar a asa que lhes falta...e poderão finalmente voar. Somente através do amor irão chegar até onde estou...da mesma forma que você, meu anjo. E eles nunca... nunca estarão sozinhos quando forem voar."

Deus silenciou em seu sorriso.

O anjo compreendeu o que não precisava ser dito.

O CAMINHO DO TIGRE


O homem caminhava pela floresta quando viu uma raposa aleijada."Como ela se alimenta?", pensou.Neste momento, um tigre se aproximou com um animal entre os dentes. Saciou sua fome, e deixou o que havia sobrado para a raposa.

"Se Deus ajuda a raposa, irá me ajudar também", refletiu. Voltou para sua casa, trancou-se, e ficou esperando que os Céus lhe dessem comida. Nada aconteceu. Quando já estava ficando fraco demais para sair e trabalhar, um anjo apareceu.

- Por que você resolveu imitar a raposa aleijada? - perguntou o anjo. Levante-se, pegue suas ferramentas, e siga o caminho do tigre!

ANJOS DISTRAÍDOS


Era uma vez um anjinho, muito distraído, chamado Amorel. Ele recebeu uma incumbência de Deus:

- Amorel, acabo de inventar os humanos, eles estão classificados como homem e mulher. Cada um tem seu par e já estão todos alinhados de par em par. Pegue esta bandeja de humanos e leve para que eles habitem a Terra.

Amorel ficou contente, pois há muito tempo o Senhor não o chamava para tão nobre trabalho. O anjinho pegou a bandeja e ao virar uma esquina lá no céu, trombou com uma anjinha chamada Amanda. A bandeja voou longe, e todos os casais de humanos se misturaram. Amorel e Amanda ficaram desesperados e foram contar para Deus o ocorrido.

O Senhor falou:

- Vocês derrubaram, vocês juntarão!

Porém, parece que Deus se esqueceu que os anjinhos eram muito distraídos. E é por isso que a cada dia os casais se juntam e se separam.

Os dois anjinhos trabalham incessantemente para que os casais originais se encontrem.

O trabalho é muito difícil, tanto é que por muitas vezes eles juntam casais errados, pois os humanos espalhados ficam inquietos e cobram o serviço dos anjinhos o tempo todo.

Quando os humanos se mostram muito desesperados, os anjinhos unem dois desesperados, mas logo depois percebem o engano e os separam. E, por muitas vezes, está separação é brusca, pois não se tem tempo a perder.

Recebi um bilhete dos dois anjinhos e vou mandar pra você agora:

"Se você é um humano, queremos pedir desculpas pela nossa distração, pois errar não é só humano!

Estamos trabalhando com empenho, porém, sempre contando com a ajuda de vocês. Não se desesperem, mas também não se isolem, tentem se mostrar realmente quem é cada um de vocês, pois à medida que cada um mostrar o que é de verdade, vai tornar o nosso trabalho mais fácil.

Aproveitamos a oportunidade para nos desculpar pelas separações abruptas, sabemos que elas geram muito transtorno, mas se nós o separamos de alguém, é por que em algum canto vimos alguém bem mais parecido e, por isso, precisamos isolá-los para facilitar o encontro."

O PREÇO DO PARAÍSO


Em Cracóvia, na Polônia, havia um homem muito pobre, que não conseguia sequer arranjar dinheiro para sustentar sua família. Quando chegou o Natal, envergonhado de não poder dar nenhum presente à sua mulher, resolveu vender o único animal que possuía - uma galinha, que lhe dava todos os dias pelo menos um ovo para comer. Imaginava que podia comprar algo de belo, mas naquele mesmo dia ela caiu doente, e o homem teve que usar quase todo o dinheiro em remédios. Desesperado, foi procurar o padre do seu bairro.

- Sobrou algo da venda? - perguntou o padre.

- Dez centavos.

- Tudo que vem de Deus tem sua razão de ser. No caminho de volta, passe no mercado e compre para sua mulher a primeira coisa que custar dez centavos. Ela ficará alegre com o presente.

O homem agradeceu, e foi até o mercado. Viu lindas jóias e pensou: "Deus me fará encontrar algo barato".

Aproximou-se da barraca e falou com o comerciante:

- Tenho dez centavos: o que posso comprar?

- Dez centavos! Estou diante de um maluco! A jóia mais barata vale cem moedas de ouro!

- Mas o padre disse que eu conseguiria comprar algo.

Como não havia movimento àquela hora, o comerciante resolveu se divertir:

- Na verdade, eu estava pensando em vender meu lugar no paraíso. E custa exatamente dez centavos!

Sem hesitar, o homem tirou o dinheiro, e o comerciante escreveu em um papel de embrulho: "Vale um lugar no paraíso." Os dois apertaram as mãos, certos de que tinham feito um bom negócio.

Naquela noite, o comerciante, dando gargalhadas, contou a história à sua esposa. Ela reagiu, histérica:

- Jamais viverei com alguém que engana os pobres, e justamente na época de Natal! Saia daqui, e só volte quando tiver este pedaço de papel de novo em suas mãos!

O comerciante, aterrorizado, saiu e começou a procurar o homem por toda a cidade, até que o encontrou.

- Na verdade, eu o enganei - disse. - Aqui estão seus dez centavos, por favor, me devolva o papel.

- Mas eu estou satisfeito! Comprei porque quis, e minha mulher ficará contente com um lugar garantido nos céus!

- Está bem: então já estará ganhando dinheiro, porque lhe pagarei vinte centavos por este papel.

- Não se preocupe, o senhor não me enganou, e estou satisfeito.

- Vou lhe fazer uma oferta que não poderá recusar: lhe darei uma moeda de ouro por este pedaço de papel.

O homem, porém, não se impressionou:

- Uma moeda não resolve meus problemas. Preciso de dez moedas de ouro, porque é isso que ela merece; poderá comprar todos os presentes que deseja, e que nunca pude lhe dar.

O comerciante levou um susto: dez moedas! Mas era pagar isso, ou não poder voltar. Pagou, pegou o papel, e correu para casa.

- Dez moedas de ouro por este papel sem valor! - disse para a esposa. - Aqui está o seu presente de Natal, e não me peça nada mais!

Neste momento, um anjo apareceu para a mulher:

- Quando o seu marido estava disposto a vender seu lugar no paraíso por dez centavos, ele não custava nem um centavo sequer. Mas quando ele se dispôs a comprar de volta por dez moedas de ouro, apenas por amor à você, saiba que o lugar passou a valer muito mais que isso.

"Deus coloca as pessoas certas, nas horas certas, para que se ajudem mutuamente. Graças a você, a alegria da noite de Natal será maior nos céus - porque a alma do seu marido foi salva; também será maior na terra, porque um homem pobre pôde dar dez moedas de ouro para sua esposa. Por tudo isso, agora você merece também sua recompensa."

E transformou o pedaço de papel em uma esmeralda, que até hoje pode ser vista em uma casa na região de Grabarka, na fronteira com a Bielo-Russia.

(Baseada em uma lenda judaica)

TODO MUNDO TEM UM ANJO CHAMADO.


Uma criança, pronta para nascer, perguntou a Deus:

"Dizem-me que estarei sendo enviado à Terra amanhã. Como eu vou viver lá, sendo assim pequeno e indefeso?"

Deus: "Entre muitos anjos, eu escolhi um especial para você. Ele o Estará esperando e tomará conta de você".

Criança: "Mas diga-me: aqui no céu eu não faço nada a não ser cantar e sorrir, o que é suficiente para que eu seja feliz. Serei feliz lá?"

Deus: "Seu anjo cantará e sorrirá para você e... A cada dia, a cada instante, você sentirá o amor de seu anjo e será feliz".

Criança: "Como poderei entender quando falarem comigo se eu não conheço a língua que as pessoas falam?"

Deus: "Com muita paciência e carinho, seu anjo lhe ensinará a falar".

Criança: "E o que farei quando eu quiser Te Falar?"

Deus: "Seu anjo juntará suas mãos e lhe ensinará a orar".

Criança: "Eu ouvi que na Terra há homens maus. Quem me protejerá?"

Deus: "Seu anjo lhe defenderá mesmo que signifique arriscar a própria vida".

Criança: "Mas eu serei sempre triste porque não Te verei mais".

Deus: "Seu anjo sempre lhe falará sobre Mim e lhe ensinará a maneira de vir a Mim, e Eu estarei sempre dentro de você".

Nesse momento, havia muita paz no Céu, mas as vozes da Terra já podiam ser ouvidas. A criança, apressada, pediu novamente:

"Oh, Deus, se eu estiver a ponto de ir agora, diga-me, por favor, o nome do meu anjo!".

Deus: "Você chamará seu anjo de MÃE"!!!"

LENDA DA FLOR DE LÓTUS


Certo dia, num tranqüilo lago solitário, em cuja margem se erguiam frondosas árvores, com perfumadas flores de mil cores, e coalhadas de ninhos, onde aves canoras chilreavam, encontraram-se quatro elementos irmãos: o Fogo, o Ar, a Água e a Terra.

- Quanto tempo sem nos vermos em nossa nudez primitiva - disse o Fogo cheio de entusiasmo, como é de sua natureza.

- É verdade - disse o Ar. - É um destino bem curioso o nosso. À custa de tanto nos prestarmos para construir formas e mais formas, tornamo-nos escravos de nossa obra e perdemos nossa liberdade.

- Não te queixes - disse a Água -, pois estamos obedecendo à Lei, e é um Divino Prazer servir à Criação. Por outro lado, não perdemos nossa liberdade. Tu corres de um lado para outro, à tua vontade; o irmão Fogo entra e sai por toda parte, servindo à vida e à morte. Eu faço o mesmo.

- Em todo o caso, sou eu quem deveria me queixar - disse a Terra - pois estou sempre imóvel e, mesmo sem minha vontade, dou voltas e mais voltas, sem descansar no mesmo espaço.

- Não entristeçais minha felicidade ao ver-nos - tornou a dizer o Fogo - com discussões supérfluas. É melhor festejarmos estes momentos em que nos encontrarmos fora da forma. Regozijemo-nos à sombra destas árvores e à margem deste lago, formado pela nossa união.

Todos o aplaudiram e se entregaram ao mais feliz companheirismo. Cada um contou o que havia feito durante sua longa ausência, as maravilhas que tinham construído e destruído. Cada um se orgulhou de se haver prestado para que a Vida se manifestasse através de formas sempre mais belas e mais perfeitas. E mais se regozijaram, pensando na multidão de vezes que se uniram fragmentariamente para o seu trabalho.

Em meio de tão grande alegria, existia uma nuvem: o homem. Ah! Como ele era ingrato. Haviam-no construído com seus mais perfeitos e puros materiais, e o homem abusava deles, perdendo-os. Tiveram desejo de retirar sua cooperação e privá-lo de realizar suas experiências no plano físico. Porém a nuvem dissipou-se e a alegria voltou a reinar entre os quatro irmãos. Aproximando-se o momento de se separarem, pensaram em deixar uma recordação que perpetuasse, através das idades, a felicidade de seu encontro. Resolveram criar alguma coisa especial que, composta de fragmentos de cada um deles, harmonicamente combinados, fosse também a expressão de suas diferenças e independência, e servisse de símbolo e exemplo para o homem. Houve muitos projetos que foram abandonados por serem incompletos e insuficientes. Por fim, refletindo-se no lago, os quatro disseram:

- E se construíssemos uma planta, cujas raízes estivessem no fundo do lago, a haste na água e as folhas e flores fora dela? - A idéia pareceu digna de experiência.

- Eu porei as melhores forças de minhas entranhas - disse a Terra - e alimentarei suas raízes.

- Eu porei as melhores linfas de meus seios - disse a Água - e farei crescer sua haste.

- Eu porei minhas melhores brisas - disse o Ar - e tonificarei a planta.

- Eu porei todo o meu calor - disse o Fogo - para dar às suas corolas as mais formosas cores.

Dito e feito. Os quatro irmãos começaram a sua obra. Fibra sobre fibra foram construídas as raízes, a haste, as folhas e as flores. O sol abençoou-a, e a planta deu entrada na flora regional, saudada como rainha.

Quando os quatro elementos se separaram, a Flor de Lótus brilhava no lago em sua beleza imaculada, e servia para o homem como símbolo da pureza e perfeição humana. Consultaram-se os astros, e foi fixada a data de 8 de maio - quando a Terra está sob a influência da Constelação de Taurus, símbolo do Poder Criador - para a comemoração que, desde épocas remotas, se tem perpetuado através das idades. Foi espalhada esta comemoração por todos os países do Ocidente, e, em 1948, o dia 8 de Maio se tornou também o "Dia da Paz".

sábado, 28 de agosto de 2010

Os Viajantes e a Bolsa de Moedas


Dois homens viajavam juntos ao longo de uma estrada, quando um deles encontrou uma bolsa cheia de alguma coisa. E ele disse: "Veja que sorte a minha, encontrei uma bolsa, e a julgar pelo peso, deve estar cheia de moedas de ouro."

E lhe diz o companheiro: "Não diga encontrei uma bolsa; mas, nós encontramos uma bolsa, e quanta sorte temos. Amigos de viagem devem compartilhar as tristezas e alegrias da estrada."

O "sortudo", claro, se nega a dividir o achado. Então escutam gritos de: "Pega ladrão!", vindo de um grupo de homens armados com porretes, que se dirigem, estrada abaixo, na direção deles. O viajante "sortudo", logo entra em pânico, e diz. "Estamos perdidos se encontrarem essa bolsa conosco."

Replica o outro: "Você não disse 'nós' antes. Assim, agora fique com o que é seu e diga, 'Eu estou perdido'."
Autor: Esopo

Moral da História:
Não devemos exigir que alguém compartilhe conosco as desventuras, quando não lhes compartilhamos também as nossas alegrias.

As Formigas e o Gafanhoto


Num brilhante dia de outono, uma família de formigas se apressava para aproveitar o calor do sol, colocando para secar, todos os grãos que haviam coletado durante o verão. Então um Gafanhoto faminto se aproximou delas, com um violino debaixo do braço, e humildemente veio pedir um pouco de comida.

As formigas perguntaram surpresas: “Como? Então você não estocou nada para passar o inverno? O que afinal de contas você esteve fazendo durante o último verão?”

E respondeu o Gafanhoto: “Não tive tempo para coletar e guardar nenhuma comida, eu estava tão ocupado fazendo e tocando minhas músicas, que sequer percebi que o verão chegava ao fim.”

As Formigas encolheram seus ombros indiferentes, e disseram: “Fazendo música, todo tempo você esteve? Muito bem, agora é chegada a hora de você dançar!”
E dando às costas para o Gafanhoto continuaram a realizar o seu trabalho.
Autor: Esopo
Moral da História:
Há sempre um tempo para o trabalho, e um tempo para a diversão.

Os Dois Viajantes e o Urso


Dois homens viajavam juntos através de uma floresta, quando, de repente, um enorme urso surgiu do meio de um moita, à frente deles.

Um dos viajantes, pensando em sua própria segurança, correu e subiu numa árvore.

O outro, incapaz de enfrentar aquela enorme fera sozinho, deitou-se no chão e permaneceu imóvel, fingindo-se de morto. Ele já escutara que um Urso não toca em corpos de mortos.

Isso pareceu ser verdadeiro, pois o Urso se aproximou dele, cheirou sua cabeça de cima para baixo, e então, aparentemente satisfeito e convencido que ele estava morto, foi embora tranquilamente.

O homem que estava em cima árvore então desceu. Feito isso, ele perguntou:

“Me pareceu que o Urso sussurrou alguma coisa em seu ouvido. O que ele lhe disse?”

“Ele disse,” respondeu o outro, “que não é nada sábio e sensato de minha parte andar na companhia de um amigo que me deixa na mão em um momento de aflição”. xxxx

Autor: Esopo
Moral da História:
“A crise é o melhor momento para nos revelar quem são os verdadeiros amigos.”

A Águia e a Gralha


Uma Águia, saindo do seu ninho no alto de um penhasco, capturou uma ovelha e a levou presa às suas fortes garras. Uma Gralha, que testemunhara a tudo, tomada de inveja, decidiu que poderia fazer a mesma coisa.

Ela então voou para alto e tomou impulso, e com grande velocidade, atirou-se sobre uma ovelha, com a intenção de também carregá-la presa às suas garras.

Ocorre que estas acabaram por ficar embaraçadas no espesso manto de lã da Ovelha, e isso a impediu inclusive de soltar-se, embora o tentasse com todas as suas forças.

O Pastor das ovelhas, vendo o que estava acontecendo, capturou-a. Feito isso, cortou suas penas, de modo que não pudesse mais voar. À noite a levou para casa, e entregou como brinquedo para seus filhos.

"Que pássaro engraçado é esse?", perguntou um deles.

"Ele é uma Gralha meus filhos. Mas se você lhe perguntar, ele dirá que é uma Águia."
Autor: Esopo
Moral da História:
Não devemos permitir que a ambição nos conduza para além dos nossos limite

A Formiga e a Pomba


Uma Formiga foi à margem do rio para beber água, e sendo arrastada pela forte correnteza, estava prestes a se afogar.

Uma Pomba, que estava numa árvore sobre a água observando a tudo, arranca uma folha e a deixa cair na correnteza perto da mesma. Subindo na folha a Formiga flutua em segurança até a margem.

Eis que pouco tempo depois, um caçador de pássaros, oculto pelas folhas da árvore, se prepara para capturar a Pomba, colocando visgo no galho onde ela repousa, sem que a mesma perceba o perigo.

A Formiga, percebendo sua intenção, dá-lhe uma ferroada no pé. Do susto, ele deixa cair sua armadilha de visgo, e isso dá chance para que a Pomba desperte e voe para longe, a salvo.
Autor: Esopo

Moral da História:
Nenhum ato de boa vontade ou gentileza é coisa em vão

A Galinha e os Ovos de Ouro


Um camponês e sua esposa possuiam uma galinha, que todo dia sem falta, botava um ovo de ouro.

Supondo que dentro dela deveria haver uma grande quantidade de ouro, eles então a sacrificam, para enfim pegar tudo de uma só vez.

Então, para surpresa dos dois, viram que a ave, em nada era diferente das outras galinhas.

Assim, o casal de tolos, desejando enriquecer de uma só vez, acabam por perder o ganho diário que já tinham assegurado.


Autor: Esopo

Moral da História:
Quem tudo quer, tudo perde.

A Lebre e a Tartaruga


Um dia, uma Lebre ridicularizou as pernas curtas e a lentidão da Tartaruga. A Tartaruga sorriu e disse: "Pensa você ser rápida como o vento; Mas Eu a venceria numa corrida."

A Lebre claro, considerou sua afirmação algo impossível, e aceitou o desafio. Convidaram então a Raposa, para servir de juiz, escolher o trajeto e o ponto de chegada.

E no dia marcado, do ponto inicial, partiram juntos. A Tartaruga, com seu passo lento, mas firme, determinada, em momento algum, parou de caminhar.

Mas a Lebre, confiante de sua velocidade, despreocupada com a corrida, deitou à margem da estrada para um rápido cochilo. Ao despertar, embora corresse o mais rápido que pudesse, não mais conseguiu alcançar a Tartaruga, que já cruzara a linha de chegada, e agora descansava tranqüila num canto.

Autor: Esopo
Moral da História:
Ao trabalhador que realiza seu trabalho com zelo e persistência, sempre o êxito o espera.

A Lebre e o Cão de Caça


Um Cão de caça, depois de obrigar uma Lebre a sair de sua toca, e depois de uma longa perseguição, de repente parou a caçada.

Um Pastor de Cabras, vendo-o parar, ridicularizou-o dizendo:

Aquele pequeno animal é melhor corredor que você.

E o Cão de caça responde:

Você não vê a diferença que existe entre nós? Eu estava correndo apenas para conseguir um jantar, mas ele, corria por sua Vida.
Autor: Esopo

Moral da História:
O motivo pelo qual realizamos uma tarefa, é o que vai determinar sua qualidade final.

A Mulher e sua Galinha


Uma mulher possuía uma galinha, que todos os dias sem falta, botava um ovo.

Ela então pensava consigo mesma, como poderia fazer para obter, ao invés de um, dois ovos por dia.


Assim, disposta a atingir seu objetivo, decidiu alimentar a galinha com uma porção de ração em dobro.

A partir daquele dia, a galinha tornou-se gorda e preguiçosa, e nunca mais botou nenhum ovo.

Autor: Esopo

Moral da História:
O Ganancioso, cedo ou tarde, acaba por se tornar vítima de sua própria ambição.

A Mula


Uma mula, sempre folgada, pelo fato de não trabalhar e ainda assim receber uma generosa quantidade de milho como ração, vivia orgulhosa dentro do curral. Era pura vaidade, e comportava-se como se fosse o mais importante animal do grupo. E confiante, falava consigo mesma:
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Meu pai certamente foi um grande e Belo Raça Pura. Sinto-me orgulhosa por ter herdado toda sua graciosidade, resistência, espírito e beleza.
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Pouco tempo depois, ao ser levada à uma longa jornada, como simples animal de carga, cansada de tanto caminhar, exclama desconsolada:
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Talvez tenha cometido um erro de avaliação. Meu pai, pode Ter sido apenas um simples Burro de carga.
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Autor: Esopo

Moral da História:
Ao desejar ser aquilo que não somos, estamos plantando dentro de nós a semente da frustração.

As Lebres e as Rãs


As lebres, animais tímidos por natureza, sentiam-se oprimidas com tanto acanhamento. Como viviam, na maior parte do tempo, com medo de tudo e de todos, frustradas e cansadas, resolveram dar um fim às suas angústias.
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Então, de comum acordo, decidiram por fim às suas vidas. Concluiram que assim resolveriam todos os seus problemas. Combinaram então que se jogariam do alto de um penhasco, para as escuras e profundas águas de um lago.
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Assim, quando correm para o abismo, várias Rãs que descansavam ocultas pela grama à beira do mesmo, tomadas de pavor ante o ruído de suas pisadas, desesperadas, pulam na água, em busca de proteção.
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Ao ver o pavor que sentiam as Rãs em fuga, uma das Lebres diz às companheiras:
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Não mais devemos fazer isso que combinamos minhas amigas! Sabemos agora, que existem criaturas mais medrosas que nós.
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Autor: Esopo

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Moral da História: Julgar que nossos problemas são os mais importantes do mundo, não passa de ilusão.

As Árvores e o Machado


Um homem foi à floresta e pediu às árvores, para que estas lhe doassem um cabo para o seu machado novo. O conselho das árvores então concorda com o seu pedido, e lhe ofertam uma jovem árvore para este fim.

E logo que o homem coloca o novo cabo no machado, começa furiosamente a usá-lo, e em pouco tempo, já havia derrubado com seus potentes golpes, as maiores e mais nobres árvores daquele bosque.

Um velho Carvalho, observando a destruição à sua volta, comenta desolado com um Cedro seu vizinho:

O primeiro passo significou a perdição de todas nós. Se tivéssemos respeitado os direitos daquela jovem árvore, também teríamos preservado os nossos, e poderíamos ficar de pé, ainda por muitos anos.
Autor: Esopo

Moral da História:
Quem menospreza seu semelhante, não deve se surpreender se um dia, outros fizerem o mesmo consigo.

A Serpente e a Lima


Uma serpente, ao entrar no local de trabalho de um ferreiro, procurou ali em meio às ferramentas, alguma coisa capaz de matar sua fome.
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Ela dirigiu-se então à uma Lima (ferramenta usada para polir ou desbastar metais ou objetos duros ), e perguntou-lhe gentilmente se esta não lhe poderia dar comida.
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A lima respondeu: “Você deve ser muito boba minha amiga, se espera obter de mim alguma coisa, logo eu, que sou acostumada a sempre tirar dos outros, e nunca lhes devolver nada.”
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Autor: Esopo

Moral da História: Os avarentos são péssimos doadores.

A Raposa e as Uvas


Uma Raposa, morta de fome, viu, ao passar diante de um pomar, penduradas nas grades de uma viçosa videira, alguns cachos de Uvas negras e maduras.
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Ela então usou de todos os seus dotes e artifícios para pegá-las, mas como estavam fora do seu alcance, acabou se cansando em vão, e nada conseguiu.
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Por fim deu meia volta e foi embora, e consolando a si mesma, meio desapontada disse:
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Olhando com mais atenção, percebo agora que as Uvas estão todas estragadas, e não maduras como eu imaginei a princípio.

Autor: Esopo

Moral da História:
Ao não reconhecer e aceitar as próprias limitações, o vaidoso abre assim o caminho para sua infelicidade.

O ENIGMA DO FERREIRO E O ROSTO DO REI


No tempo do imperador Frederico, havia um ferreiro que trabalhava o ano inteiro no seu ofício, sem guardar domingos, nem a Páscoa nem dias santos, por mais solene que fosse a festa.

Trabalhava todos os dias até ganhar quatro soldos, mas depois disso não dava mais nenhuma martelada, mesmo que fosse da maior urgência o trabalho encomendado, e ainda que lhe pagassem muito bem.

Um dia alguém o denunciou ao imperador por profanar os dias santificados, trabalhando como nos demais dias do ano. Frederico o convocou à sua presença, e perguntou se era certo o que lhe diziam. O ferreiro não negou, e então o rei perguntou:

— Qual o motivo que te leva a quebrar o preceito dos dias santificados?

— Senhor, para atender às minhas obrigações, tenho que ganhar quatro soldos todos os dias. Conseguido isso, termina para mim a jornada até o dia seguinte.

— E o que fazes com esses quatro soldos?

— Senhor, eu os divido em quatro partes iguais. Uma eu devolvo, faço doação de outra, jogo fora a terceira, e uma eu invisto na minha subsistência.

— Explica melhor isso.

— A doação, senhor, eu a faço pagando impostos. A devolução é devida ao meu pai, tão velho e pobre que já não pode ganhar o próprio sustento, pelo que ele me emprestou quando eu era ainda criancinha e não podia trabalhar. Desperdiço a outra parte dando-a à minha mulher, para os seus gastos, o que é o mesmo que jogar fora, pois ela não sabe fazer nada além de comer e beber. Invisto na minha subsistência o restante, quer dizer, na manutenção da minha casa.

O imperador pensou então: “Se o mandasse parar de fazer assim, eu o colocaria injustamente em muitos apertos. Mas vou impor a ele uma condição severa, e se não a cumprir, vai me pagar caro”. Disse então ao ferreiro:

— Vai com Deus! Mas a explicação da tua conduta, que me deste agora, não a podes contar a ninguém. Nem uma única palavra, antes de ver meu rosto cem vezes, sob pena de cem libras de multa.

Não era fácil para um simples ferreiro ver o rosto do rei umas poucas vezes, quanto mais cem, o que significaria para ele silêncio definitivo sobre o assunto.

No dia seguinte o imperador resolveu apresentar aos seus sábios um enigma, e pediu-lhes que explicassem o sentido oculto da moeda devolvida, da moeda doada, da moeda jogada fora e da moeda investida. Deu-lhes oito dias de prazo para a resposta.
Depois de muito discutirem e não acharem a solução, os sábios concluíram que o assunto devia guardar relação com a presença do ferreiro ante o imperador, mas nenhum deles sabia o que se passara entre os dois. Não achando outra saída, resolveram espionar o ferreiro, e compareceram às escondidas na oficina. Pediram-lhe que desse a explicação, mas o ladino se conservou hermético. Ofereceram-lhe então dinheiro em troca da informação. Depois de deliberar consigo mesmo, o ferreiro respondeu:

— Já que estais tão interessados, juntai cem libras de ouro, pois só mediante essa quantia eu poderei dar-lhes a explicação.

Convencidos de que seria tempo perdido insistir, e temendo que se esgotasse o prazo de oito dias, quotizaram-se e puseram em mãos do ferreiro as cem libras. Com toda calma ele foi pegando uma por uma das moedas, e as olhava com atenção na frente e no verso. Todas as moedas continham em relevo a efígie do imperador, sendo de um lado a figura eqüestre, e do outro a face. Terminado esse lento ritual, ele explicou aos sábios o caso, exatamente como o explicara ao imperador. Os sábios saíram dali contentes.

Esgotado o prazo de oito dias, apresentaram-se ao imperador e lhe deram a explicação pedida, deixando-o muito surpreso, pois tudo coincidia com as palavras do ferreiro. Suspeitou logo que ele tivesse dado com a língua nos dentes, e pensou: “Esses sábios não seriam capazes de descobrir sozinhos toda a explicação, e o devem ter ameaçado ou até açoitado para obtê-la. Vou chamá-lo, e agora ele vai ter de me pagar toda a dívida atrasada”. Mandou chamar o ferreiro, e lhe perguntou:

— Parece que, apesar da minha proibição, falaste mais do que era conveniente, revelando o segredo que eu te havia confiado. Agora vais ter de pagar amargamente a leviandade.

— Senhor, podeis dispor não só de mim, como também de todo o mundo para fazer o que vos agrada, por isso a vós me entrego como a um pai e senhor muito amado. Porém não creio ter infringido vossas ordens, que eram de guardar o segredo até conseguir ver a vossa face cem vezes. Por isso perderam tempo todos os que tentaram obter de mim o segredo antes de haver cumprido aquela condição. Mas depois que me apresentaram cem libras de ouro, e que na presença dos interessados eu contemplei vossa augusta face em cada uma delas, não tive dúvidas em contar-lhes o que sabia. Não me parece portanto que eu vos tenha ofendido. Além do mais, eu com isso me livrei da presença insistente e incômoda dos tais sábios.

— Vai com Deus, e que Ele te dê sorte, pois foste bastante mais inteligente do que todos os meus sábios juntos!

(Novellino, in R. Menéndez Pidal, Antología de cuentos – Labor, Barcelona, 1953)

O Menino e o Padre


Um padre andava pelo sertão, e como estava com muita sede, aproximou-se duma cabana e chamou por alguém de dentro.

Veio então lhe atender um menino muito mirrado.

- Bom dia meu filho, você não tem por aí uma aguinha aqui pro padre?

- Água tem não senhor, aqui só tem um pote cheio de garapa de açúcar! Se o senhor quiser... - disse o menino.

- Serve, vá buscar. - pediu-lhe o padre.

E o menino trouxe a garapa dentro de uma cabaça. O padre bebeu bastante e o menino ofereceu mais. Meio desconfiado, mas como estava com muita sede o padre aceitou.

Depois de beber, o padre curioso perguntou ao menino:

- Me diga uma coisa, sua mãe não vai brigar com você por causa dessa garapa?
- Briga não senhor. Ela não quer mais essa garapa, porque tinha uma barata morta dentro do pote.

Surpreso e revoltado, o padre atira a cabaça no chão e esta se quebra em mil pedaços. E furioso ele exclama.

- Moleque danado, por que não me avisou antes?

O menino olhou desesperado para o padre, e então disse em tom de lamento:

- Agora sim eu vou levar uma surra das grandes; o senhor acaba de quebrar a cabacinha de vovó fazer xixi dentro!


Nota:
Conto regional do nordeste, muito conhecido em quase todas as cidades do interior, de Pernambuco ao Maranhão. Origem desconhecida.

A Borboleta


Havia uma garotinha que gostava de passear pelos jardins, quando um dia vê
uma borboleta espetada em um espinho. Muito cuidadosamente ela a solta
e a borboleta começa a voar para longe.

Então ela volta lhe diz:
- Por sua bondade, vou conceder-lhe seu maior desejo.

A garotinha pensou por um momento e replicou:
- Quero ser feliz.

A borboleta inclinou-se até ela e sussurrou algo em seu ouvido
e desapareceu subitamente.

A garota crescia e ninguém na terra era mais feliz do que ela.

Sempre que alguém lhe perguntava sobre o segredo de sua felicidade,
ela somente sorria e respondia:

- Soltei a borboleta e ela me fez ser feliz.

Quando ela ficou bem velha, os vizinhos temeram que o seu segredo
fabuloso pudesse morrer com ela.

- Diga-nos, por favor - eles imploravam - diga-nos o que a fada disse .

A agora amável velhinha simplesmente sorriu e disse:

- Ela me disse que todas as pessoas, por mais seguras que pudessem parecer,
precisavam de mim!"

Na verdade... Nós todos precisamos uns dos outros, eu por exemplo
preciso de você...do seu carinho e da sua amizade.

Não se esqueça:Amizade é sempre querer a pessoa que ama ao seu lado.
Amizade não é ocasional, interessada ou pretensiosa.
Amizade é para ser constante e para sempre como
o amor de Deus é para nós.

Quando você ajuda alguém, por mais pequeno que seja, você está liberando
felicidade para sua vida. Felicidade implica em ajudar o próximo, se doar.
Se você ainda só quer receber, a tal felicidade nunca lhe baterá a porta.

A Camisa do Camponês


Narra antiga lenda, que certa vez um rei adoeceu gravemente e à medida

que o tempo passava seu estado piorava.

Os médicos tentaram de tudo, mas nada parecia funcionar.

Estavam a ponto de perder a esperança quando a velha criada falou:

- Eu sei uma forma de salvar o rei. Se vocês puderem encontrar um homem feliz,

tirar-lhe a camisa e vesti-la no rei, ele se recuperará.

Ao ouvir tal afirmativa, o Rei enviou seus mensageiros a todos os cantos do reino

a procura de um homem feliz. Eles cavalgaram por todos os lugares e não

encontraram um homem feliz.

Ninguém estava satisfeito; todos tinham uma queixa a fazer.

- "Aquele alfaiate estúpido fez as calças muito curtas!

Ouviram um homem rico dizer."

- "A comida está péssima, este cozinheiro não consegue fazer nada direito!

Outro reclamava."

- "O que há de errado com os nossos filhos? Resmungava um pai insatisfeito."

- "O teto está vazando! A situação financeira está péssima.

Será que o Rei não pode dar um jeito nessa situação?"

Essas e outras tantas queixas eram o que os mensageiros do rei ouviram

por onde passaram.

Se um homem era rico, não tinha o bastante; se não era rico,

era culpa de alguém.

Se era saudável, havia uma sogra indesejável em sua vida.
Se tinha uma boa sogra, a gripe o estava infelicitando.

Enfim, naquele reino todos tinham algo do que reclamar.

O Rei já tinha perdido a esperança de ficar bom, quando numa noite, seu filho

cavalgava pelos campos e, ao passar perto de uma cabana ouviu alguém dizer:

- Obrigado Senhor! Concluí meu trabalho diário e ajudei meu semelhante.

Comi meu alimento, e agora posso deitar-me e dormir em paz.

O que mais poderia desejar, Senhor?

O príncipe exultou de felicidade por ter, finalmente, encontrado um homem feliz. Retornou e mandou que seus homens fossem até lá e levassem a camisa

do homem ao rei e lhe pagassem o quanto pedisse.

Mas quando os mensageiros do rei entraram na cabana para despir a camisa

do homem feliz, descobriram que ele era tão pobre que sequer possuía uma camisa.

Ossaim




Certo dia, Ifá, o senhor das adivinhações veio ao mundo e foi morar em um campo muito verde. Ele pretendia limpar o terreno e, para isso, adquiriu um escravo. O que Ifá não esperava era que o servo se recusasse a arrancar as ervas, por saber o poder de cura de cada uma delas. Muito impressionado com o conhecimento do escravo, Ifá leu nos búzios que o criado era, na verdade, Ossaim, a divindade das plantas medicinais. Ifá e Ossaim passaram a trabalhar juntos. Ossaim ensinava a Ifá como preparar banhos de folhas e remédios para curar doenças e trazer sorte, sucesso e felicidade.

Os outros orixás ficaram muito enciumados com os poderes da dupla e almejaram, no seu íntimo, possuir as folhas da magia. Um plano maquiavélico foi pensado: Iansã, a divindade dos ventos, agitou a saia, provocando um tremendo vendaval. Ossaim, por sua vez, perdeu o equilíbrio e deixou cair a cabaça onde guardava suas ervas mágicas. O vento espalhou a coleção de folhas.

Oxalá, o pai de todos os orixás, agarrou as folhas brancas como algodão. Já Ogum, o deus da guerra, pegou no ar uma folha em forma de espada. Xangô e Iansã se apoderaram das vermelhas: a folha-de-fogo e a dormideira-vermelha. Oxum preferiu as folhas perfumadas e Iemanjá escolheu o olho de santa-luzia. Mas Ossaim conseguiu pegar o igbó, a planta que guarda o segredo de todas as outras e de suas misturas curativas. Portanto, o mistério e o poder das plantas continuam preservados para sempre.



Lenda africana

O Porco e o Milhafre


O Porco e o Milhafre eram dois inseparáveis amigos. O porco invejava as asas do Milhafre e insistia contínuamente com o amigo para que lhe arranjasse umas iguais para voar também.

O Milhafre dispôs-se a fázer-lhe a vontade. Conseguiu arranjar penas de outra ave e, com cera, colou-as nos ombros e nas pernas do seu amigo Porco. Este ficou radiante e começou a voar ao lado do seu amigo Milhafre.

Quis acompanhá-lo até às grandes alturas, mas a cera começou a derreter-se com o calor e as penas foram caindo uma a uma. À medida que as penas se despegavam, ía o porco descendo, contrariado. Quando as penas acabaram de se soltar, o porco caiu e bateu no chão com o focinho. E com tanta força bateu, que este, ficou achatado.

Zangou-se o Porco com o Milhafre dizendo que tinha querido matá-lo, porque grudara mal as asas.

Desde essa ocasião deixou de ser amigo do Milhafre e, quando o vê pairar no alto, dá um grunhido e olha para ele desconfiado. E aqui está a razão porque o Porco tem o focinho achatado e nunca mais quis voar.



Conto africano

O leão e os gnus



Uma grande fome ocorreu e diversos animais morreram, deixando o Leão faminto por não encontrar o que caçar. Depois de muito andar, chegou até um campo coberto por capim verde e viu um casal de Gnus. Tamanha fome, nem se preocupou em espreitar e atacou. O Gnu, ao ver o Leão, disse:

- Espere majestade. Sabia que somos os últimos gnus desta região. Quando me matar ou matá-la, não haverá nenhum outro e em poucos dias estará com fome novamente. Mas se nos deixar vivos, em poucos meses, teremos uma ninhada de gnus e poderemos encher a região de presas novamente.

O Leão ponderou e disse:

- Mas até lá, como irei sobreviver?

- Ora, faça como nós. Veja que grama verde, esmeralda, brilhante, fresca e agradável. Se você fizer um pequeno esforço, comendo-a, poderá suportar a espera.

O Leão concordou e começou a ruminar. Os gnus visitavam-no diariamente, sempre enaltecendo as qualidades do repasto. Na primeira semana o Leão sofria, torcendo o focinho quando se alimentava, sonhando com um bom pedaço de carne crua. Na segunda, já dava de ombros, resignado com o seu destino. Quando finalmente notou os jovens gnus correndo, rolou na grama e pensou:

- Eu, correr e caçar? Quando a grama se dobra a minha vontade, servida para meu jantar?

E assim, ficou o Leão, pastando feito um Gnu.



Fonte: Fábulas de Paratahan.

O Rato do campo e o rato da cidade




Um rato do campo tinha por amigo um outro da cidade, e o convidou para que fosse comer na campanha. Mas como só podia oferecer-lhe trigo e ervas, o rato da cidade lhe disse:

- Sabes amigo, que levas uma vida de formiga? Por minha vez, possuo bens em abundância. Vem comigo e a tua disposição os terás.

Partiram ambos para a cidade. Mostrou o rato da cidade a seu amigo trigo e legumes, figos e queijo, frutas e mel. Maravilhado, o rato do campo bendizia seu amigo de todo o coração e renegava sua má sorte. Enquanto assim se divertiam, um homem de repente abriu a porta. Espantados pelo ruído os dois ratos de lançaram temerosos a um buraco. Voltaram logo a buscar figos secos, porém outra pessoa entrou no lugar e, ao vê-la, os dois se precipitaram novamente atrás de um toco para se esconder. Então o rato do campo, esquecendo de sua fome, suspirou e disse ao rato da cidade:

- Adeus, amigo, vejo que comes até te fartar e que estás muito satisfeito; porém, é a preço de mil perigos e constantes temores. Eu, por minha vez, sou um pobretão e vivo mordiscando a cevada e o trigo, mas sem ter que fugir nem ter temores sobre nada.

É tua a decisão de escolher dispor de certos luxos e vantagens que sempre vão unidos a sustos e dificuldades, ou viver um pouco mais austeramente, mas com serenidade.


Fábula de Esopo.

O Médico-Fantasma




Esta história tem sido contada de pai para filho na cidade de Belém do Pará. Tudo começou numa noite de lua cheia de um sábado de verão. Dois garotos conversavam sentados na varanda da casa de um deles.

- Você acredita em fantasma? - perguntou o mais novo.

- Eu não! -disse o outro.

- Acredita sim! -insistiu o mais novo.

- Pode apostar que não -replicou o outro. -Tudo bem. Aposto minha bola de futebol que você não tem coragem de entrar no cemitério à noite.

- Ah, é? -disse o garoto que fora desafiado. -Pois então vamos já para o cemitério, que eu vou provar minha coragem. Assim, os dois garotos foram até a rua do cemitério. O portão estava fechado. O silêncio era profundo. Estava tão escuro ... Eles começaram a sentir medo.

Para ganhar a aposta, era preciso atravessar a rua e bater a mão no portão do cemitério. O garoto que tinha topado o desafio correu. Parou na frente do portão e começou a fazer caretas para o amigo. Depois se encostou no portão e tentou bater a mão nele. Foi quando percebeu que ela estava presa.

- Socorro! Alguém me ajude! -ele gritou, desmaiando em seguida.

Nisso, apareceu um velhinho vindo do fundo do cemitério, abriu o portão e chamou o outro menino.

- Seu amigo prendeu a manga da camisa no portão e desmaiou de medo. Coitadinho, pensou que algum fantasma o estivesse segurando.

O garoto reparou que o velhinho era muito magro, quase transparente.

- Obrigado. Como é que o senhor se chama?

- Eu sou o médico daqui. Vou acordar seu amigo.

O velhinho passou a mão na cabeça do menino desmaiado e ele despertou no mesmo instante.

- Vão para casa meus filhos - ele disse. -Já passou da hora de dormir.

No dia seguinte, os meninos foram procurar o velhinho para agradecer-lhe a ajuda. Mas não o encontraram, nem no cemitério, nem em lugar nenhum. E foi assim que ambos perderam o medo de fantasma, quando perceberam que nem todos os seres misteriosos fazem o mal. Pelo contrário, podem até ajudar. Como aquele médico, que nunca mais apareceu.


(História do folclore brasileiro)

Seu Zé no tribunal



Seu Zé, mineirinho, pensou melhor e decidiu que os ferimentos que sofreu num acidente de trânsito há semanas eram sérios o suficiente para levar o dono do outro carro ao tribunal.

No tribunal, o advogado do réu começou a inquirir seu Zé:

- O Senhor não disse na hora do acidente: "Estou muito bem"?

E seu Zé responde:

- Bão, vou lhe contá o que aconteceu. Eu tinha acabado di colocá minha mula favorita na caminhonete...

- Eu não pedi detalhes! - interrompeu o advogado. Só responda à pergunta! O senhor não disse na cena do acidente: "Estou muito bem"?

- Bão, eu coloquei a mula na caminhonete e tava deceno a rodovia...

O advogado interrompe novamente e diz:

- Meritíssimo, estou tentando estabelecer os fatos aqui. Na cena do acidente este homem disse ao patrulheiro rodoviário que estava bem. Agora, várias semanas após o acidente ele está tentando processar meu cliente, e isso é uma fraude. Por favor, poderia dizer a ele que simplesmente responda à pergunta?

Mas, a essa altura, o Juiz estava muito interessado na resposta de seu Zé e disse ao advogado:

- Eu gostaria de ouvir o que ele tem a dizer.

Seu Zé agradeceu ao Juiz e prosseguiu:

- Como eu tava dizeno, coloquei a mula na caminhonete e tava desceno a rodovia quando uma picapi atravessô o sinar vermeio e bateu na minha caminhonete bem na laterar. Eu fui jogado fora do carro prum lado da rodovia e a mula foi jogada pro ôtro lado. Eu tava muito firido e num podia mi movê. De quarqué forma, eu pudia orvi a mula zurrano e grunhino e, pelo baruio, eu pude percebê que o estado dela era muito ruim.

E continuou falando o Seu Zé:

- Logo dispois do acidente, o patruiero rodoviário chegô no locar. Ele orviu a mula gritano e zurrano e foi até onde ela tava. Depois de dá uma oiada nela, ele pegô a arma e atirô bem nos óio do animar. Então, o policiar atravessô a estrada com sua arma na mão, oiô pra mim e disse:

-"Sua mula estava muito mal e eu tive que atirar nela. Como o senhor está se sentindo?"
E olhando para o Juiz, o Seu Zé perguntou:

- E o sinhô, o quê que o sinhô falava meritisso???!!!

Os Sons da Floresta


No século II depois de Cristo, o rei Ts’ao mandou seu filho, o príncipe T’ai, ir estudar no templo com o grande mestre Pan Ku. O objetivo era preparar o príncipe para suceder o pai no trono e ser um grande administrador.

Quando o príncipe chegou ao tempo, o Mestre Pan Ku logo o mandou sozinho à floresta de Mingli. Ele deveria voltar um ano depois, com a tarefa de descrever os sons da floresta. Passado o prazo,T’ai retornou e Pan Ku lhe pediu para descrever os sons de tudo aquilo que tinha conseguido ouvir.

Mestre, disse o príncipe, pude ouvir o canto dos cucos, o roçar das folhas, o alvoroço dos beija-flores, a brisa batendo suave na grama, o zumbido das abelhas, e o barulho do vento cortando os céus.

Quando T’ai terminou, o mestre mandou-o de volta à floresta para ouvir tudo mais que fosse possível. T’ai ficou intrigado com a ordem do mestre. Ele já não havia feito o suficiente?

Por longos dias e noites, o príncipe se sentou sozinho na floresta, ouvindo. Não conseguiu distinguir nada de novo, além daqueles sons já mencionados ao mestre Pan Ku.

Mas persistiu. Então, certa manhã, sentado entre as árvores da floresta, começou a discernir sons muito sutis, diferentes de todos que ouvira antes. Ele agora, não só ouvia, mas escutava.

Quanto mais atenção prestava, mais claros os sons se tornavam. Uma sensação de encantamento tomou conta do rapaz, que pensou:

- Esses devem ser os sons que o mestre queria que eu escutasse!

Sem pressa, o príncipe passou horas ali, ouvindo e escutando, pacientemente. Queria ter a certeza de que estava no caminho certo.

- Quando T’ai retornou ao templo, o mestre lhe perguntou o que mais tinha conseguido escutar:

“Mestre, quando prestei mais atenção, pude ouvir o inaudível – o som das flores se abrindo, do sol aquecendo a terra e da grama bebendo o orvalho da manhã”.

O mestre acenou com a cabeça em sinal de aprovação:

- “Ouvir o inaudível é ter disciplina para se tornar um grande administrador”, observou Pan Ku. “Apenas quando se aprende a ouvir o coração das pessoas, seus sentimentos mudos, os medos não confessados e as queixas silenciosas, um administrador pode inspirar confiança a seu povo, entender o que está errado e atender às reais necessidades dos cidadãos. A morte de um país começa quando os líderes ouvem apenas as palavras pronunciadas pela boca, sem mergulhar fundo na alma das pessoas para ouvir seus sentimentos, desejos e suas reais opiniões”.

Foi assim que T’ai se tornou um sábio e afetuoso rei.

A Pereira da Tia Miséria


Havia no princípio do mundo uma velhinha muito pobre e muito infeliz: era conhecida pelo nome de Tia Miséria. Só possuía uma casinha arruinada e uma pereira no quintal. Tudo sofria com paciência e resignação, mas só uma coisa não desculpava, nem perdoava: que os meninos da vizinhança subissem na pereira e lhe comessem as peras. Seria capaz de dá-las todas sem provar uma, mas indignava-se contra os que as roubavam.

Uma noite bateu-lhe à porta um pobrezinho, quase morto de fome e lhe pediu comida e pousada por uma noite. Fazia muito frio e Tia Miséria acomodou-o perto do fogão e deu a ele a migalha de pão que reservava para si. No dia seguinte despediu-se o pobre e disse-lhe que pedisse o que quisesse.

- Só peço que as pessoas que subirem à minha pereira não possam descer sem o meu consentimento – respondeu a velhinha.

- Assim será – respondeu o mendigo.

No ano seguinte, quando estavam madurinhas as primeiras peras, Tia Miséria chegou ao quintal e encontrou três garotos em cima da pereira.

- Ó Tia Miséria, perdoe-nos pelo amor de Deus! Tire-nos daqui, não podemos descer.

- Ah, é? Pois vocês diziam que não eram os ladrões das minhas peras! Pois tomem isso e mais isso! Disse Tia Miséria dando uma sova nos meninos com uma vara. Desta vez vou permitir que desçam, mas se voltarem, já sabem: hão de ficar aí por muitos anos!

E os garotos desceram e não mais voltaram à pereira.

Até que em uma noite chuvosa, bateram-lhe à porta.

- Já vou, já vou! Gritou Tia Miséria.

Era uma mulher de horrendo aspecto, vestida de negro, com as asas negras nos ombros e nos pés.

- O que... o que... quer? - Perguntou Tia Miséria a tremer.

- Tenha uma boa e santa noite, Tia Miséria.

- Você me conhece? Perguntou assombrada.

- Vamos, Tia Miséria. Chegou a sua hora.

Foi então que Tia Miséria percebeu a foice debaixo da capa da estranha criatura. Nesse momento, se deu conta de que tinha aberto a porta para ela... ela mesma... a MORTE!

- Sou a Morte: venho buscar-te e estou com pressa.

- Já? Pois nem ao menos pode me dar um ano de espera?

- Não pode ser - respondeu a Morte.

- Faça-me ao menos um último favor: suba à minha pereira e colha-me a última pera que me resta. Quero comê-la, visto que é a última. Enquanto isso, vou me preparando para a partida.

- Tudo bem, mulher, mas anda rápido!

A Morte subiu à pereira, colheu a pera, mas não pôde descer. Pôs-se a chamar a velhinha. Esta respondeu: “Tem paciência, maldita, pois aí ficarás por todos os séculos. És má, tens feito muitas desgraças, roubando muitos pais aos seus filhos pequeninos...”

E a Morte ficou em cima da pereira durante dias, semanas, meses.

- Por onde anda a morte? Perguntavam os velhinhos e os doentes terminais nos hospitais.

Depois de um ano, e depois de muita procura, Tia Miséria percebeu, na frente da sua porta, um comitê composto de padres que se queixavam de que não havia enterros, de médicos enfurecidos com o pouco profissionalismo da morte: uma coisa era alargar a vida, outra muito diferente era estender a dor. Ali estavam também escrivães e advogados que se lastimavam de não ter inventários, de donos de funerárias que reclamavam da queda das vendas de caixões; enfim, eram todos aqueles que vivem da morte do próximo. Todos pediam à velha que autorizasse a Morte a descer da pereira, mas Tia Miséria respondia: “Não quero, não quero e não quero”!

Falou então a Morte do alto da pereira e fez com a velha um trato: se a deixasse descer, pouparia sua vida enquanto o mundo fosse mundo. A velhinha consentiu e a Morte desceu. Saiu correndo dali com a promessa de nunca mais bater à porta de Tia Miséria. Mas compensou o tempo perdido: nunca morreram tantos em tão pouco tempo.

É por isso que enquanto o mundo for mundo a Miséria existirá sobre a Terra.



Conto tradicional português, recolhido por Ataíde Oliveira